a última vez que visitei
o velho foi pra buscar os filmes.
ele me chamou pelo nome
do meu pai como de costume
mas não levantou pra me
cumprimentar.
um par de muletas apoiado
no braço da poltrona.
o volume de uma fralda
sob a calça.
a mulher dele me levou ao
escritório e apontou pro alto da estante.
uma caixa de papelão enorme e caindo aos pedaços.
uma caixa cheia de álbuns
de foto e rolos de filme fedendo a mofo
e produtos químicos.
e produtos químicos.
hoje acordo, abro o email
e recebo a notícia de que o velho morreu.
hoje, mais de um ano
depois da visita, me dou conta:
aquela caixa era a vida
do velho.
aquela caixa era a vida
do velho em carne, osso e celulose.
aquela caixa era a vida
do velho se decompondo, se desfazendo.
se despedindo.
se despedindo.
aquela caixa era a vida do velho
e da poltrona ele se
agarrava a ela com os olhos
com medo de soltar.
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