Tarde de Agosto
sobre tua cama estendido me pergunto se serei lido,
um dia,
num livro velho de capa dura.
se mãos alvas antigas sustentarão o peso de páginas amarelas
entre dedos ressecados de tanto, e tanto tempo
e tanto sol.
cerro os olhos mas não durmo.
a noite chega, se apinha entre o topo cego dos prédios, tons de branco tingido. a noite passa,
gasta e úmida,
noite sem lua. tanta terra,
tanta poeira de estrelas. pouso a cabeça
no fino travesseiro de penas, será que um dia, será que um dia serei lembrado
por olhos marejados de pranto? e na varanda
de um estado estrangeiro, ser lido à luz rasa
pela voz branda mais doce que a idade. e na cadeira
o poeta novo celebrará o centenário das dezenas
de anos mortos do meu corpo em silêncio. e se os frutos que não tenho
hão de nunca brotar, nem mesmo a água do mar há de trazê-los.
Drummond, nossa inquietude gêmea, te escrevo essas tristes palavras por inveja pura
de não ser milagre, de não ser bendito ou ter graça,
funcionário público, nada. no dia
em que confrontei a pedra cálida da tua cova não pude, não pude evitar ver a data
da tua morte gravada na rocha. nem o pó, nem o tempo
extinguiu nosso gesto perdido.
dezessete de agosto
de mil novecentos e oitenta e sete. na lápide, nosso segredo encerrado
na textura fria do mármore.
sobre tua cama estendido me pergunto se serei lido,
um dia,
num livro velho de capa dura.
se mãos alvas antigas sustentarão o peso de páginas amarelas
entre dedos ressecados de tanto, e tanto tempo
e tanto sol.
cerro os olhos mas não durmo.
a noite chega, se apinha entre o topo cego dos prédios, tons de branco tingido. a noite passa,
gasta e úmida,
noite sem lua. tanta terra,
tanta poeira de estrelas. pouso a cabeça
no fino travesseiro de penas, será que um dia, será que um dia serei lembrado
por olhos marejados de pranto? e na varanda
de um estado estrangeiro, ser lido à luz rasa
pela voz branda mais doce que a idade. e na cadeira
o poeta novo celebrará o centenário das dezenas
de anos mortos do meu corpo em silêncio. e se os frutos que não tenho
hão de nunca brotar, nem mesmo a água do mar há de trazê-los.
Drummond, nossa inquietude gêmea, te escrevo essas tristes palavras por inveja pura
de não ser milagre, de não ser bendito ou ter graça,
funcionário público, nada. no dia
em que confrontei a pedra cálida da tua cova não pude, não pude evitar ver a data
da tua morte gravada na rocha. nem o pó, nem o tempo
extinguiu nosso gesto perdido.
dezessete de agosto
de mil novecentos e oitenta e sete. na lápide, nosso segredo encerrado
na textura fria do mármore.
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