quinta-feira, 31 de outubro de 2013

noites assim


em noites assim,
até o ruído do computador
faria falta entre o silêncio.

em noites assim,
quem sabe exatamente
quanto pesa a solidão –

10, 20 kg? 1 tonelada?

em noites assim,
não há como ignorar
o vazio das paredes.

em noites assim,
não há remédio
senão ir pra cama

ver as horas dançarem no teto.

domingo, 27 de outubro de 2013

que candor?


entre a neblina, de repente
como um sonho, um pato-real
desaparece na distância.
a mente é uma ampla nuvem flutuando.

a ponta dos dedos que descobre o corpo
também guarda o cheiro do hábito,
a linguagem da pele.

pois é pessoa, a noite veio
e a alma é vil mesmo, tão leve a sede,
tão em ordem as pétalas do metal
(as mãos em x sobre o guarda-chuva). 

o sr. veja bem, seus serviços aqui
não são mais necessários,
discurso repetido 

age diretamente na dor.
a gente se fala depois.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

ausência


de manhã, ausência é algo
que se vê descer pela descarga
em redemoinhos.

pelo ralo da pia,
com remela e pasta de dente.

de manhã, ausência é algo
que ferve na chaleira
e se mistura ao café, queima

a boca, depois
desce pela garganta.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

uma semana


hoje faz uma semana
e me sento na frente do computador.

hoje faz uma semana
e escuto música, tomo vinho, leio.
shiraz, tchekhov, prokofiev.

dar nome às coisas nesse silêncio é inútil.

hoje faz uma semana
e começo um filme e paro antes da metade.
tomo vinho, faço massa na leiteira.
vejo notícias de futebol.  

hoje faz uma semana
e mijo olhando o fundo manchado

da patente.
hoje faz uma semana.

5.ª feira


outra vez, a noite escorreu
pelo ralo (5 horas

de diferença entre
a saudade e o outono).

1:00 da manhã
nesse enterro de 5.ª feira.

ou eletrochoque


olhos fechados pra não dormir.
boca seca, lugar comum.

estico o braço, acendo a luz.
tomo um gole d’água e pego papel e caneta.

só amor cura sofrimento,

não lítio.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

a tempo


no último dia você
não quis nem tomar café.

a gente ficou deitado,
o sol entrando pelas frestas 
da persiana.

o iphone tocava a cada 3min.

já passava das 7
quando a gente levantou.

você se vestiu,
escovou os dentes e eu
comecei a arrumar
a mala.

nada ia mudar a tempo.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

idas e vindas


milhares de acenos
em portões de embarque
e cafés com leite
em saguões de aeroporto.

a distância evaporada
se condensa contra o metal
e se impõe
sob a forma de adeus.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

idée fixe


schoenberg, qual
o sentido das coisas
se o monstro de cleveland
morre gozando.

qual a moral das horas
se elas voltam 
pro mesmo lugar.

qual o papel da arte
em tempos assim.

basquiat, ravel,
hokusai.

tarde demais
prum leitmotiv.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

sarabanda


quem te ouviu antes da sirene,
do horário de visita.

do prozac, das noites de insônia.

quem te ouviu buscando ar
embaixo d’água.

quem te ouve agora.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

ao invés


hoje cedo o despertador 
tocou e te alcancei o celular.

fechei os olhos, virei de lado.

botei a perna sobre a tua 
mais quente e tentei dormir, 
torcendo pro tempo ter 
voltado atrás

na decisão de passar.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

um alívio


ruas giram sob céus de 6, 
7 anos atrás.
aliás, quanto tempo faz que os olhos não veem

mais 1 palmo à frente do nariz.
que pena, o craquelê da pele é testemunha.

lambada de serpente, vermeer.

o avião chacoalha no ar (peso da escotilha: 17,5 kg).
que coisa, o medo de morrer.

a esteira de bagagem.
aliás, teu rosto outra vez.

um alívio.