quinta-feira, 31 de março de 2011

o som e a fúria



te encontrou doente num tempo 
em que buscou socorro

na tua cama, buscou correr de si mesmo,
do mundo, de todos os cantos

em que alguém um dia chorou  
de tanto esperar. 

e cruzou de ônibus as mesmas ruas, retas. 
os mesmos dias, o mesmo céu. 

os mesmos segundos do mesmo relógio. 
a mesma boca, os mesmos dedos. 

o mesmo segredo. sem
ego, sem medo. sem mais receio.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Sem Sono






Naquela curva em alta, calar da noite clara—

de luzes de vidro, postes e carros e cones.

Na curva do abismo da ponte, a ponta
de um gigante de metal mais vivo que a vida,
mais triste 
do que esses mais tristes dos homens,

homens que nunca dormem.

A lente mais pesada dentro da sala mais cansada,
um quarto escuro com mariposas adormecidas
no teto, deus, a morte de uma calma sã, passagem
de encontro, os troncos das árvores num fundo branco, tanto faz

se tanto mais amor que enquanto.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Perto Demais






tão perto, perto demais.

dois mundos no teu rosto.
um gosto amargo de adeus.
teus olhos úmidos de dor,
meus olhos em vão.

certezas mortas e verdades não ditas.
solidão de ausência, marca de culpa.

dias de chuva.

tempo demais pra pensar
em pouco tempo de viver.

domingo, 20 de março de 2011

Dreams in the Dusk
(poema traduzido de Carl Sandburg)






sonhos ao anoitecer,
somente sonhos no encerrar do dia
e com o seu fim o retorno
das coisas cinzas, das coisas escuras,
o longe, a distante profundeza da terra dos sonhos.

sonhos, somente sonhos ao crepúsculo,
os antigos retratos recordados
de dias perdidos em que a perda dos dias
escreveu em lágrimas faltas do coração.

lágrimas e perdas e sonhos partidos
hão de encontrar o peito uma noite.
Barbárie





e essa lua maior 
trouxe a chuva e com ela
os ventos. foram dias 
de uma obscura penumbra

em que a ausência do céu
prenunciava algo antigo, talvez
arcáico. um tempo 
fora do tempo.

quinta-feira, 17 de março de 2011

At a Window
(tradução de poema de Carl Sandburg)






me dê fome,
vocês deuses que sentam e tomam
as decisões do mundo.
me dê fome,dor e vontade,
me cubra de vergonha e fracasso
e que me deixe de fora
dos portões de fama e ouro,
me dê sua mais lúcida e sórdida fome!

mas me deixe algum amor,
uma voz pra me falar ao fim do último dia,
uma mão que me toque no quarto escuro
quebrando a longa solidão.
na aurora de formas do dia
ofuscando o sol poente,
vaga, estrela do oeste
vinda dos limites das sombras.
me deixe ir à janela;
olhar as formas do dia na aurora
e esperar sabendo a chegada
de um pouco de amor.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Balcony







it was once a vivid dream
but now it is gone

like the faded ink of old pages,
features of water
carved in stone.

life knows not time
when days pretend to be,

one has fallen from the sky
just to sink into the sea.

sábado, 5 de março de 2011

sem dose de medo, sem não.
(à ela, humildemente.)






eu vi o alguém que tu escondia dentro.
eu vi o vazio das palavras sussurradas
e o desespero de cada letra de tinta contraída
sem mais coragem de sair.
um suspiro esfumaçado na janela, tristeza nublada
em dinheiro, em nada, em pó.
o corpo perdido de uma mente embaralhada.
faltou carinho quando ainda havia tempo
mas o tempo acabou.
uma vida, uma chance, o medo de errar,
lágrimas que ninguém vê;
alguém me avise quando entender.
preciso escrever,
nas paredes, nos trilhos do trem, no corpo de alguém
que também sofre de um mal de viver.
treme, sua, vomita, pede pelo amor de deus que pare,
que por um segundo tudo pare de ser o que é.
encontre a redenção num abismo, num mergulho suicida,
o retorno em um sopro de cinzas.
que algum dia se permita um recomeço, uma segunda chance antes
que seja tarde demais.