domingo, 28 de fevereiro de 2010

1.


Domingo. Acordara ainda cansado mesmo depois de uma noite de quase 9 horas de sono; sono leve e perturbadiço é verdade, mas ainda sim de sono. Sábado havia sido um daqueles dias pesados, um daqueles díficeis dias de trabalho. O corpo doído havia sem dúvida pago o preço maior. Rolara na cama de manhã ainda por certo tempo, mas a certa altura a fome já era mais forte do que fora o cansaço que ainda persistia. Mas era domingo, e o dia todo pertenceria a absolutamente nada; nada a fazer, nada a pensar; nada. Mais tarde, depois do almoço, dormiria ainda mais uma vez, e mais uma vez um sono um tanto quanto perturbado - como sempre é o sono fora de hora, repleto de pesadelos de semi-inconsciência e de inconstância entre realidades. Quando despertou de vez sentiu no ar a carga do prenúncio da chuva, o ar quente que havia de chofre se tornado fresco, passageiro. Não tardou a ouvir os primeiros sinais de trovões. Já com um livro nas mãos, mergulhado em Raymond Chandler, ouvira com imenso prazer o cair vagoroso das primeiras gotas de chuva contra o piso da calçada, contra o asfalto, contra as folhas e a grama do jardim. Só o destino enviaria um dia assim; o vento soprava delicado embora constante, soprava vibrante, trazia quietude à alma inquieta que agora enfim encontrava aos poucos repouso. Respirava fundo. Era o dia que havia pedido a Deus. E era ainda meio de tarde, com noite inteira ainda por vir, noite fresca finalmente, noite de chuva silenciosa e pensamentos indistintos e indiferentes - noite de nada, noite de nada pela frente.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Lapso
(do verso de uma nota fiscal)






voltei,
estou de volta;
e como passou rápido.
(rápido demais)

alegre reencontro
interrompido
no despertar da consciência

que me assegura
que tudo não passa
de sonho

e que me assegura
que acordarei no quarto,
na cama,

do outro lado do mundo.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Mar






O mar
Não faz esquecer
E não apaga -
Mas afasta
E afugenta -
A cada onda
Que rebenta,
A cada onda
Que passa -
A cada mergulho
Na água gelada

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Não me venha com


me traga hoje
um daqueles filmes simples
sem filosofia
ou pensamentos de existência.
com sonho,
com o delírio da vertigem
de outra vida

que eu hoje cansei
demais
e já não sei se
posso mais

me traga hoje
um daqueles poemas simples
de melodia fácil
e estrutura medíocre, de rima óbvia,
que não perturbe e
não desperte
demônios adormecidos,
mas que traga à lembrança
a esperança da tua voz,

que eu hoje cansei
demais
e já não sei se
posso mais

me traga hoje
uma daquelas noites simples
de chuva e vento forte,
de dia exaurido de amor contido
mas sem tanta tristeza
e desâmparo, sem tanto amor
perdido, passado,

que eu hoje cansei
demais
e já não sei se
posso mais.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Em um momento qualquer






no final/
da tarde de hoje/
fiquei por um tempo
deitado no chão,
olhar fixo,
perdido,
mirando reto/
o teto,
cinza,
áspero e esburacado;
mas não era o teto
o que eu via
mas sim teu rosto/
lá colado,
liso, cabelo preto/
e olhos escuros,
sorrindo...
eu sonhava acordado
num final de tarde
qualquer/
pensando em o que
dizer/
e pensando
se deveria te escrever;
se deveria despertar
o que não consigo dormir.
Midday Memories







your flowing tears
tasted just -
like wasted
time,
like all those years
that we now
lost sight,
that passed us by
like a distant
rhyme,
like a distante kiss
durin' a midnight bliss -
upon the moonlight
glow
while my fingertips runned by
your brow, slow-
ly,
gently,
forgetting to remember
that it was already
december
and that now you're
gone, far
but I still keep the
scar
real close to the
bone -
so I'll feel it's there, somewhere,
like memories
deep engraved,
like visions one cannot erase -
that taste, the taste
of your flowing tears
I cannot erase,
so I'll keep them with me
- forever safe

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Comum






não há alguém que não espere
por um outro algo
ou um outro alguém;
alguém que espera ser salvo,
alguém que espera
mas que não tem.
alguém que espera calmo
porque já não espera
por mais ninguém.
alguém que espera pelo trem
que deixa cedo
a estação,
alguém que espera por um dedo
pois ja desistiu de esperar a mão.
alguém que espera
mas é sem medo
porque aguarda mas em segredo.
alguém que espera um amor
inteiro,
alguém que espera um meio
amor que seja,
espera que alguém ao menos veja
aquela carta do correio,
sem selo, escrita em vão apelo.
alguém que espera pelo tempo,
que passe, que fique ou que volte;
alguém que espera que a sorte
um dia mude com o vento
e que seja lento
mas seja forte.
alguém espera que não importe
ou que não faça diferença,
alguém espera pela morte,
e que venha doce
mas venha densa.
alguém espera por uma terra
que seja longe além do alcance,
onde aguarde o fim da espera
e alguém que espera
por uma chance.
Remoendo o passado III
Perto do Aeroporto






à noite eu canto longe,
ao som de pesadas
aeronaves, a pousar
e decolar;
pessoas que vão
ou que chegam
de algum / pralgum
lugar.
o que sente cada uma
delas,
lá em cima solta no ar,
quando o monstro de metal
ultrapassa as nuvens e alcança
a altura do luar?
sempre sou outro
voando -
sempre um outro coração;
outra alma,
outro sentido,
em outra direção.
sempre observo ao redor
e procuro identidade;
procuro o encontro
e alguma verdade
nessa tal realidade.
eles pousam
e decolam
e as vezes sou eu lá,
no lugar deles.
e neste caso
é impossível ficar
indiferente.
Remoendo o passado II





No meio da madrugada desperto suado, suando. Calor abafante numa madrugada de chuva, raios e trovões. Tiro a camisa e ligo o ventilador. É inverno, mas algo no meu sonho esquenta - e meu corpo logo responde. Já demanhã não mais chove, mas tem cara de chuva, cara fechada. Sento em frente ao computador com a minha caneca de café. Cena que se repete. A tristeza em mim se diluiu um bocado, e eu hoje sinto a alma um tanto mais leve, mais solta. Hoje provavelmente começo a leitura de um livro da Clarice, apesar de ainda sentir uma certa vontade de já me lançar de cabeça em Brothers Karamazov. Talvez eu precise de um breve descanço psicológico da literatura russa, tão bela e tão desgastante, sempre à beira da loucura. Covardia ou bravura?
Provavelmente me preservando, me afastando um pouco do quase inevitável, do bem provável,
leia-se na verdade - insanidade.
Remoendo o passado
(extratos de dias que já se foram.)





Não entro na questão de ser ou não ser arte. Pra mim, tal questão simplesmente deixou de
existir, por hora, por motivo simples; tenho me perguntado muito sobre o significado de tal
idéia, tentando apreende-la além do conceito, da palavra; creio que nesse caso mais vale
confiar nos sentidos, do sentimento decorrido da contemplação pura daquilo que se pretende
ser e que na verdade somente em alguns casos o é de fato. Tal fenômeno exprime um momento
que é na verdade único: Deus falando através do homem. Que outra explicação há? Quando se
observa, em uma contemplação de fato pura e completa evidentemente, uma tela, digamos, de
Monet por exemplo, como aquela com as duas meninas na canoa sob um rio negro, belíssima tela,
que se percebe em realidade alí? Como aquilo, tudo aquilo que da tela emana até o observador
e consequentemente vice-e-versa, poderia ser meramente produto das mãos de determinado
indivíduo? É ISTO TAMBÉM, sem dúvida nenhuma, sob um foco; mas perceba, há algo muito além disso alí, naquela tela, naquele determinado indivíduo ao menos naquele determinado instante: há Deus, há Deus seja lá o que se queira entender por tal idéia e palavra. Assim é Cezanne, Van Gohg, Renoir, Beethoven, Bach, Mozart e nem entrarei literatura adentro por motivos pessoais de envolvimento. Indivíduos através dos quais o divino da existência se pronuncia, se anuncia, se mostra real, a real realidade; arte. O grande poema, a grande sinfônia, a obra-prima em tinta, na tela. É claro que tudo isso são expressões, e como tais passam por um
saber expressar tal fenômeno divino. Pois, de uma forma ou de outra, tenho convicção de que na verdade esse mesmo divino é sentido, ao menos por um instante fugaz, em todo e qualquer indivíduo, por tudo e toda coisa existente neste mundo que, afinal, é o mundo de Deus. Todavia cabe a poucos, devido à aptidões, circunstâncias, acaso, destino ou o quê? Ou é concebido a poucos o dom de, de fato, ouvir a voz de Deus e expressá-la em beleza, mesmo quando triste e melancólica beleza. Foi isso que senti hoje, ao ficar frente a frente àquela tela de Cezanne; olhos marejados de lágrimas, olhar perdido no horizonte da pintura, no infinito do representado. Vertigem, sonho. Um momento fora do tempo, fora do espaço, perdido...Perdido no horizonte sonhado.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Night's Balance






nothing is/ what it seems to be
and you're not yet free/
untill you choose to see;
why can't I stop dreamin'/
about you and me?
the same you/ but with a different melody,
maybe a different sound/
by wich we keep bein' helplessly bound -
together, doesn't even matter
if it is all just ilusion,
sinking into deep confusion/
stuck between those unreal dephts -
but I can still remember
the warmness of your breath,
under my ear, behind my neck -
it just keeps coming back and back/
the same memories back again,
pieces of you that I've lost
but that at least for once I've gained;
I didn't own them/
but I could reach and touch them.
Do outro lado






quando longe
e sozinho
sonhar é quase o único
caminho.

a distância cansa
o que alma não alcança,

a esperança é ânsia
da alma que não descansa,

do desejo vão que dança,
dança, como fumaça
rumo ao céu estrelado,

perdido,
voando em busca do teu lado.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

o dia todo, todo o dia


somente um dia
como tantos outros -
tal qual
qualquer outro dia igual;
dia de prantos, de sorrisos,
dia de tanto, tão pouco,
dia normal,
dia louco;
dia de chuva,
dia de sol
e até de temporal -
dia que amanheceu escuro,
anoitecido,
e que conforme foi passando,
foi aos poucos clareando;
das contas no final -
um qualquer dia especial.

Some Destiny






I'll be close
to 50
and I'll be broke,
wasted, tired,
mad and crazy.

I'll be living upon
dead memories,
past loves,
lifes I didn't live
and dreams,
by all means.

I'll be breathing
smoke in hell
with Jesus Christ
alone, all alone
with that far away look in the eyes
and that deep sigh
of grieve.

I'll by writing
sad poems
without relieve,
sad songs,
sad words in a
sad world
of wondering
and never knowing.

I'll be through with
all, all the way
down,
just waiting
for the next dawn
and still
I won't be ready
nor willing
to go.