terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Na tarde branca






na tarde branca,
alva
e fria de neve
há um'alma manca
que ao leve vento
canta
uma canção
que em vão
arranca,
que leva a leve neve
embora, agora,
para longe
do peito,
para onde à beira
do leito
venha o sono
embalar,
morno, a cantar,
em riste,
quase em pranto,
a mesma triste
canção que eu canto.
Aeroporto Fechado






espero,
aguardo -

o voo
que nunca parte;

na sala
de embarque
só o tédio
ao meu lado -

que vem,
invade;

o tempo,
covarde,

sente medo
de virar
passado

e passa
lento -

porque se espera
que passe logo.
Só que






Parto agora
sem tristeza
pois a distância
é ilusória.

A proximidade
engana
o coração que chora.

De que vale
o teu lado
se não tenho
o teu toque?

Quero mais
é ir pra longe,
pr'onde tua lembrança
eu não alcance
mas tão somente evoque.
Tão perto e Tão longe







olhando a tua
foto...

...tão perto
e tão longe;

tua presença tão distante
é agora ausência no horizonte...

...tão perto
e tão longe;

ontem, amanhã
e hoje.
Lascia qu'io Pianga





deixe
que eu chore

essa minha
sorte cruel

e que eu
suspire

por liberdade;

que eu
suspire

e que a dor
destrua
o martírio

por piedade.

sábado, 19 de dezembro de 2009


Passado





depois de todos esses anos
retirei a tua foto
da minha parede

não para esquecer
mas para levar junto
comigo

no verso dizia escrito:

"amor: não esquece
que eu te amo muito."

tinha esquecido do recado
mas do resto eu sempre
lembro.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Ausência
(escrito há muito perdido,
encontrado num caderno
qualquer)





Toda ausência será sentida,
toda falta
- castigada;

À tarde eu deitei
mas o sono não veio:
tenho insônia.

Ontem a noite eu bebí
e acordei sem te ter.

Ouço o ruído
do silêncio
e do frio arrependimento;

Ter visto o momento,
te visto dentro,
não ter agarrado-o pleno.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Adeus Agora




à janela me despeço
dessa minha cidade que sou eu;
digo adeus ao asfalto no chão impresso
e digo adeus as nuvens do céu.

na paisagem um rio eu vejo
- e não há nada que me proíba
de sonhar serem as águas do Tejo
essas águas do meu Guaíba.

o sol nascendo de manhã;
à noite a luz da lua
refletindo na calçada da minha rua
as flores vermelhas do Flamboyant.

mas da janela não vejo esfinges,
tão pouco as pirâmides do Egito célebre;
vejo as casas e as pessoas
e o topo dos prédios de Porto Alegre.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Ainda Ando






só lamentos
deixei pelo caminho;

lamentos d'outros
tempos

em que andei sozinho,

andei sorrindo,

disfarçando o
choro
que andava engolido;

andei indo

e andei sempre
voltando;

ainda ando,
dum andar queu
inda amo;

andei assim d'andar
errado, andei
andando

- acuado,

lamentando eu fui
seguindo...

andei errando SIM,

mas andando

- eu segui indo.
Mau Hábito






já projeto um amor
que inda nem nascer nasceu
mas que de algum jeito queu
não sei
já aqui no meu peito
se escondeu;

e já é dor, já é
lembrança, já é um sonho
de esperança.

tem a distância
mas não importa,
meu pobre coração
vive mesmo é da ilusão.
[vai ver por isso
não é são]

nem é salvo, alvo
fácil do acaso, do que pode
virar caso
mas que pode vir a ser
descaso, e nesse caso

vira dor, vira lembrança,
vira sonho e a
esperança
me esquece, me enfraquece
e me abandona,

passa ao largo, passa
ao longe, passa onde
eu já não passo.
[porque eu
já não posso]
Mais uma manhã que choveu






perdido
entre bitucas de cigarro
adormecidas no cinzeiro
e copos incompletos
de cerveja.

repleto de fumaça
que dança incerta cinza
no lugar,
do filtro branco para o
pulmão,
do meu pulmão para o ar.

muito barulho;
muita música e muita
conversa
mas eu silencío
e só observo, quieto,
encarando o tédio nos olhos:
a gente se conhece
já tem um tempo.

quantas vezes mais
vou errar pelo mesmo caminho
quantas vezes mais
vou errar por ele sozinho
quantas vezes mais
eu vou fingir que não ligo
?

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Feitiço do tempo






passagem dos dias,
passagem das horas,
de um tempo ilusório
que inda assim me devora,
me consome sem
confronto,
chega
- e pronto,
vai-se embora
- e ponto.
Lar




O dia da partida,
a despedida anunciada;
camuflado na rotina
não percebi que se achegava.

Agora bate à minha
porta
a me dizer que
já é hora,
que passada a nova aurora
será tempo d'irme embora.

Me chega então
a sensação
da espera agora finda,
desta última noite minha
nesta minha terra que é
tão linda.
O direito dela





"estou cansada
desta vida"

dizia a carta
da suicida.

"fui feliz
mas não quero mais;
chega agora
de lutar
e de todas essas contas
para pagar"

"eu quero o mar
no céu azul,
Deus
e o abraço da minha mãe"

"estou cansada
e quero paz,
fui feliz mas
não quero mais;
não quero mais".

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Tu já não mais





por entre as cinzas
do carvão
busco as baganas
que me darão
a porta de saída
das dores do mundo

- ilusão;

mas porque não?

de que mais se vive
então?

coragem para sair,
coragem para ficar.

cansaço, paz, Deus

- querer te encontrar...

mas será que foi tudo
como disse na carta e
como queria que fosse,

assim, doce,
o consolo de tudo?

- luto;
eu ainda
luto.
Eu & a calçada






A impressão que tivera ao longo da noite toda de que a vida
poderia ser até certa medida controlável se desfez por completo
no instante em que a roda dianteira esquerda do carro beijou
violentamente o cordão da calçada. Beijou e recuou. Tornou
rápida ao meio da pista, recuperando-se. Ufa. Não foi o primeiro
beijo que presenciei. E nem haverá de ter sido o último.
Coisa mais frágil a vida que, ainda que se tenha as mãos firmes
ao volante, toma de chofre decisões à parte que não cabem aos
homens. Coisa mais frágil a vida. O que decide quem vai e
quem fica? O carro segue na madrugada alta cortando as ruas
da cidade ainda escura, ainda não de todo amanhecida. O ocorrido
se diluí aos poucos na embriaguez das risadas. Não foi nada.
Sem muito mais a fazer a respeito, digo para mim mesmo
que não foi nada.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Leila






Acordei e ela estava morta. Não na minha frente, mas no jornal ao pé da porta.
A musa da minha infância que eu em tantas noites tive em sonho comigo, bela,
linda, um pedaço puro do céu em corpo e rosto de mulher. Morta, suicidada.
Um baque; confesso que me desesperei um pouco. Já há quanto tempo não me
recordava nem do teu nome? Há quanto já não via uma foto sequer do teu rosto
de anjo? Parece que essa morte já há muito tempo se anunciava em mim, eu que havia
esquecido de lembrar de ti. Já tinha lá seus 50 anos, mas afirmava que esses
eram 40. Uma carreira que há muito vinha em declínio, e que de atriz meiga de
novela já havia descambado para sem-vergonha do mundo pornô; digo isso sem
maiores julgamentos além de um coração partido, o meu. Se matou trancada no
quarto, comendo comida envenenada. Já havia, parece, feito dada cirurgia para
retirada do útero; se ainda viva, não poderia nem mais ter um filho. Ah! Leila,
que foi que fizeram contigo? Vejo tua foto, em floripa, e teu sorriso é melancólico,
teu semblante - desistido. Que foi que fizeram contigo? Garanto que na época de
Rei do Gado ou Playboy a solidão não existia, nem a angústia, nem o desespero.
É falsa a vida Leila, e é cruel e mentirosa. Queria ter te visto ainda que já morta,
acariciar teus cabelos negros mortos e te dizer que tudo está bem, mesmo não
estando. Queria que eu pudesse ter te salvado, ou te dito alguma palavra que te
fizesse pensar em tudo mais uma vez. Ah! Leila, que vida essa mais vagabunda!
Vida salafrária, ordinária, que até sonho tira...Vai com Deus minha amada, e encontra
na morte o que tu perdeste na vida, a paz do teu sorriso que eu sonhei quando
criança demente, a doçura da tua boca - que eu só sonhei que provava; o teu amor
que eu dizia ser meu e o meu amor que eu não pude te dar.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Meu poema não é flor




Meus versos não tem nação,
não tem pátria e não tem musa;
meu poema não tem destino,
não é canção
e não é hino.

Minha poesia é toda
desfeita de ideologia,
é às vezes vazia
deu nem saber se é poesia.

Meus versos não tem lar,
não tem morada ou porto-seguro,
meu verso é apenas um muro
que eu construí porque é lá queu durmo.

Meu poema não tem moral,
não tem ética e nem pudor,
não tem vergonha, cara de pau,
de ser poema perdedor.
Adeus de novo






Mais uma vez a despedida
veio minh'alma castigar;
ela que ainda se escondia
no impúne passar dos dias
e que tardou a chegar.


Mas quando chega arrebata
e não há escapatória;
nessa hora a glória
está naquilo que teme,
que sofre
mas que não mata,
enfrenta e sobrevive.
Ainda assim






se o vento sopra,
constante e calmo,
então porque o desespero
e o medo absurdo
de ter vivido errado
minha única chance ?

se a grama ainda cresce
verde,
errante e serena,
então porque o alarido
por todo amor
desperdiçado ?

se o céu ainda se fecha,
cinzento e se nublando,
é porque nem mesmo
uma manhã inteira de sol
é para sempre;
mas tudo segue seguindo,
sendo como tem que ser.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Era para ser um poema bonito





este é um poema
advindo de Dezembro,
trazido pelo vento

- que o levará até
Janeiro;

é um poema
barqueiro,
que navega
os mares dos meses

- deste oceano de fezes
que é o ano
inteiro.
Elástico






não foi por cálculo matemático
que me fui ficando assim
enigmático, fui abandonando
o que era prático
e me tornando sorumbático.