domingo, 29 de janeiro de 2017

lá fora a neve não para há semanas




noites em claro e crises de pânico.
ela virando de um lado pro outro, o peito doendo, o coração acelerado.

ele abraçando e dizendo calma, já vai passar.
boa parte do tempo ele não sabe o que dizer.

ela tomando dois comprimidos de rivotril pra conseguir dormir.
ele tomando uma garrafa de vinho pra deitar na cama
e não se ouvir pensar.

ela de manhã cedo chorando na mesa do café,
o chambre branco atirado sobre as costas da cadeira.

lá fora a neve não para há semanas.

ali dentro ele bem que tenta servir de apoio, mas muitas vezes
acaba machucando.


domingo, 15 de janeiro de 2017

um começo



numa sinaleira da ipiranga
um homem caminha entre os carros com um cartaz de papelão
fome
ajuda
feliz natal

numa estação de metrô em são paulo
um ambulante defende uma transexual e é espancado até a morte.

essa noite sonhei com um poema que salvava vidas
e mudava o mundo por completo
e acordei sem lembrar de nem uma linha.

num presídio no amazonas
60 pessoas são assassinadas durante uma rebelião.

na praia de capão novo, uma garota de 16 anos
é estuprada na frente do namorado.

num aeroporto em lisboa
uma senhora enxuga lágrimas num guardanapo.

em páginas e mais páginas de caderno
tento lembrar de uma única palavra que seja daquele poema
e não consigo. 

o sonho já é um começo.