sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

nossa fome



um véu esbranquiçado cobria a cidade naquela madrugada. 
lembra quando o dia amanhecia,
eu disse, depois da chuva,
e a umidade em forma de orvalho pairava no ar, suspensa?
a gente quase não queria que o sol nascesse,
completei, pousando a mão sobre a dela.

sob a névoa pálida,
as pessoas na calçada não tinham mais nome, ou face,
como sombras que não se distinguem da escuridão.
tudo que se vê nessas horas,
continuei, ainda em tom melancólico, é elétrico——
faróis e lanternas traseiras,
postes de luz, sinais de entrada das estações de metrô,
letreiros digitais de ônibus, L90, 3, 18.

ao redor, a cerração baixava sem nitidez.
em tempos assim, eu sabia,
o abismo azul dos olhos dela era a única coisa capaz de calar
a linguagem metálica, o rumor das coisas sem vida.
naquela fundura jazia a certeza
de que enquanto houvesse coragem, não faltaria carinho.


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