terça-feira, 28 de setembro de 2010

ao amigo Érico


enquanto eu hoje trabalhava
fiquei pensando em escrever
um poema
de resposta-agradecido
a um antigo conhecido -

de sorriso sempre fácil
e de caráter tão forte,
que jamais temeu a sorte
de saber-se ser distinto;

pois nunca duvide do que sinto
e acredite na presença -
não há ausência que se assente
por entre gente como a gente.

e espere sempre a re-união,
de tabaco e copo na mão,
ao fim de qualquer noite,
ao fim do mundo,
dois saudosos vagabundos.

as mãos





as mãos envelhecem mais cedo.

se tornam duras e ásperas e secas,
como a vida seca, e áridas,
como o sertão que eu li mas nunca vi.

cobertas de veias grossas
que mais parecem tubos de encanamento.

de dedos tortos de tanto estralo,
de tanto estralo de anos e anos,
de ossos inchados
por onde anel nenhum passa.

por onde só o tempo é que passa,
veloz e sagaz,
consumindo sem misericórdia
o instrumento do tato[que nunca esqueceu
a textura do teu corpo]

as mãos envelhecem mais cedo,
retrato da vida que passa e do tempo
que aos poucos
escorre pelos dedos.
culpado






foi coisa de pouco
mais de um segundo de atraso
e ele já havia apanhado
pelo pescoço na boca o pássaro

que gritou desesperado
enquanto agarrei o cusco pelo cangote
e o atirei de lado.

um segundo de atraso.

o pássaro ainda gritava em minhas mãos,
batendo as asas em plena angústia
enquanto plumas desfiavam no ar.

um segundo de atraso.

quando coloquei-o com os pés no chão
nem fez força
e desabou por completo
com os olhos ja semi-cerrados
de uma resolução que eu nunca havia visto.

um só segundo de atraso

e fui passando a mão pelo seu corpo,
acariciando as penas
enquanto os dedos buscavam a chaga.

um segundo de atraso

e um pescoço destroncado.
sabia que não iria viver.
já nem se movia mais,
já nem mais respirava.
morto de olhos abertos, de bico aberto,
morto, morte...

um segundo de atraso
e uma vida que não salvei.
o corvo, a causa.






tenho sonhado todas as noites
e despertado dezenas de vezes
por entre sonhos,
confuso,
semi-inconsciente.

são sonhos ou pesadelos
poluídos por personagens ao acaso
de diferentes contextos
e passagens
da minha vida,
da minha própria lira
de vinte e poucos anos.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

na verdade não me importa






eu tenho ouvido muita conversa
sobre 2012
e o fim do mundo,

e outro dia alguém me perguntou:
"então, se a catástrofe vier
e a desgraça acontecer
tu estarás preparado
e habilitado para prover
os frutos da tua própria subsistência?

na hora não encontrei resposta,
mas agora sim:

se algo maior do que eu
decidir que a humanidade padeça
em 2012 ou seja lá quando for -

fecharei meus olhos
e morrerei em paz
orgulhoso e feliz
da vida que levei;

porque eu amei,
talvez até demais,

eu perdi
e eu sofri -

mas eu sorri
muito mais do que eu chorei.