quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Pouco Depois Que Você Morreu




Sentado nos degraus de entrada do bar fechado numa
manhã de sábado ainda cinza, as pessoas descendo a rua
com pressa fumando cigarro ou falando no telefone. 
Os pombos circulando em volta a procura de qualquer
migalha de qualquer coisa—doce ou salgada. 
Ao meu lado um copo de isopor de café da lanchonete do
turco que ele faz por 2 dólares. Um rato dá as caras no bueiro. 
Eu interrompo a leitura do livro, Tender is the Night, e fito
o rosto dessa moça de cabelos curtos na capa amassada.
A tela do celular me diz que já são 7:12 enquanto eu rezo por
um atraso, enquanto eu fecho os olhos e sonho que hoje não
preciso ir trabalhar e a van do japonês encosta para
descarregar o que na lanchonete turca eles vendem como carne.
Ele usa luvas brancas de plástico e se move com rapidez,—ágil
e sem perda de tempo. Na pensão ao lado turistas ingleses
fumam na frente de chinelo e calça de moletom com a indiferença
de quem sabe que esse dia não reserva qualquer tipo de obrigação.
Eles nem usam relógio. E até sorriem com facilidade.
Eu saco uma caneta sem tampa da mochila e rabisco no
marcador de livro um poema que possa me tirar daqui. 

São 7:27 e o caminhão deve encostar a qualquer momento. 
Devagar o sol começa a aparecer em cima do prédio de finanças e
serviços públicos do estado, e é horrível porque eu sei que o dia hoje
vai ser quente outra vez. Eu olho para a capa do livro fechado, para o
rosto melancólico da moça apoiado sobre o piano de cauda
escuro, o fundo cinzento, a palavra ternura.
O caminhão dobra na curva de cima e buzina—7:31 em um dia
em que a pontualidade é um chute no saco de quem espera um sinal.
A caçamba do caminhão cobre o sol enquanto estaciona mas
eu sei que essa sombra é uma mentira.
Eu abro a porta e entro e ele me atira uma lata de 500ml
de energético verde fosforescente que eu abro e sorvo como se
fosse combustível. Mas não tem nada ali para mim—o telefone
toca, eu apanho a mesma caneta sem tampa e o mesmo
marcador de livro e anoto os detalhes do endereço da casa que
eles me soletram provavelmente errado e que por isso o GPS é
incapaz de encontrar qualquer coisa que seja remotamente
parecida com aquele nome de bairro ou rua, então pega o mapa
atrás do banco do passageiro e procura lá porque fica perto
daquela região que aquela vez—

E assim eles vão falando—e a essa altura eu me lembro de você e do
carro perdendo controle e da fragilidade da vida e já começo a suar e penso
em Fitzgerald e respiro fundo e peço pelo amor de deus que ele me aponte 
uma saída honrosa de tudo isso. 




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