terça-feira, 15 de maio de 2012

Boots with Laces, by Vincent Van Gogh, Paris 1896






aletheia, van gogh, arte, heidegger




deita tua sombra pro lado
e não seja nada

ou deixe que a sombra seja
o topo do arvoredo
do dia acabado
no campo

tanto tempo andando
agora parado
contra o centeio amarelo
como o sorriso vestido
de couro gasto
de dentes esfumaçados
de ásperos pés secos
de cadarços
que mais parecem palha de trigo
a dar voltas
em torno de olhos entristecidos

que suportam o peso da terra
no peso de pernas
de vidas sem nome
sem sorte
ou vaidade

mas com entrega absoluta
e resolução de fraga
que não se esgota

mas que pra sempre habita
esse mundo erguido
difuso
e sem 
apoio
esse mundo revelado
que já não é sapato
e já não é refúgio

é uma clareira aberta
que encerra o surgimento sincero
das coisas sem conceito

o sapato é o único meio
pelo qual o quadro fala
daquilo que de outra maneira
permanece oculto
e sem significado

o sapato é a prova
da possibilidade da presença
de uma verdade que confessa
aos humanos olhos atentos
a sua forma primeira
que agora
já não é mais sapato
já não é mais apenas
coisa 
uma peça de equipamento 
mas arte
porque enquanto ergue mundos
nos remete a todo instante
à terra que concebe a tinta
o pano de fundo
a densidade do discurso
e o desconhecido
iluminado que,

brilhando, se torna

a verdade que não se toca,

a beleza
a textura da rocha
e o peso da pedra.











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