segunda-feira, 4 de junho de 2012

se lembra?





Uma parte da gente toda é poeta.
Há fases, minutos, dias ou anos
em que a gente se recolhe.
Há uma parte da gente que morre
calada, uma parte alegre
que esquece que existe.

Ainda assim há bons-dias
aos motoristas de ônibus,
respostas às caixas de supermercados,
risadas fingidas e bem-educadas 
no balcão em troca de café.
Mas o resto não passa de um silêncio taciturno
ou de um diálogo passado em um sonho,
um encontro quebrado pelo toque do despertador.

Mas essa parte sozinha,
se fosse perpétua,
não passaria de um triste destino.
Mas a gente sabe que passa, que nada
é para sempre—
e que um dia tudo acaba, 
                                  e muda.

E a gente encontra de novo
conforto em abraços, em braços morenos
desconhecidos
e consolação
no peso delicado de um corpo
ou num sopro sussurrado na orelha.

A gente redescobre uma fé no invisível
e o gosto de uma tola conversa
sobre garrafas de cerveja
ou o tamanho da lua cheia.

A gente já quase não lembra
do tempo em que dormia sozinho
e não sente falta—
do tempo em que sentir falta
era a única presença concreta.

Mas não esqueça
que essa fase também passa, como passa o outono
porque nada permanece:
                                  o que fica
é essa certeza estranha
de que a gente não é coisa definida
quiçá definitiva—

a gente é todas as vidas
no tempo de uma vida apenas.

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